segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Praxes académicas: o tema do momento....


Em relação às praxes muito se escreve sobre o assunto mas poucos de fora sabem o que realmente se passa nas praxes.

Entrar na praxe é entrar numa comunidade: o praxado sente-se obrigado a entrar para se sentir membro dela.

A tragédia do Meco, que levou à morte de 6 estudantes, permitiu que este assunto viesse à praça pública e todos - estudantes, não estudantes, ex-estudantes, os que nunca estudaram, praxados, anti-praxe - temos opinião sobre o assunto.

Na sequência das preocupações já manifestadas pelo Ministério da Educação e Ciência sobre excessos e consequências de praxes, o Ministro Crato convocou as associações de estudantes dos estabelecimentos de ensino superior, públicos e privados, para uma reunião a realizar esta semana.

Também os reitores foram  chamados...

Conto a minha experiência...

Entrei para o ensino superior com 17 anos, no dia da matrícula, vesti a minha melhor indumentária... sempre achei que a primeira imagem marca imenso e lá fui direto aos serviços académicos...

Assim que lá chego dois veteranos - e por veterano entenda-se homens de barba rija, com quase idade para serem meus pais - dirigem-se a mim e perguntam-me se eu era caloiro!!

Na minha ingenuidade respondo todo contente que sim...

Começou o disparate!!!

Levei logo com um marcador de animais na testa a dizer ENG. AMBIENTE!!! Não fiqeui muito confortável mas sorri e continuei na fila para fazer a matrícula.

Matrícula feita e fui a correr á casa de banho tirar aquelas tintas da testa... 

Mais adiante os mesmos veteranos encontraram-me e logo me perguntaram porque tinha tirado a tinta da testa... E se achava isso bem?

Respondi que não gostava de chamar a atenção e que gostava de discrição... O QUE FUI DIZER!!!

Fui levado para o átrio da faculdade onde estavam todos os veteranos e aí mandaram-me vestir os boxers por cima das calças vestidas ao contrário...Já lá estavam mais dois colegas naquele estado e em absoluta apoteose...vibravam com aquela figura!!!

Aí chega uma veterana que dizia (nunca mais me esqueci destas palavras) "Até tenho bichinhos nas mãos...se vos meto as mãos em cima!"... Passou o dia com esta conversa...

Entretanto iam chegando outros caloiros e cada vez mais os veteranos se tornavam "agressivos"...gritavam que nem loucos, não podiamos olhar para eles - caloiro olhe para o chão não olhe para mim... - e só tinham ideias tristes, a saber: rastejar, simular posições sexuais uns com os outros, medir a área do átrio com palitos, beber shots de uma panela com uns líquidos que nem se sabia o que estava lá dentro!!!

Fomos levados para um descampado e aí houve competição para ver quem se sujava mais, quem dizia mais asneiras, quem fazia as figuras mais tristes! Aliás o caloiro que mais se destacasse era bajulado à exaustão... Podiam fazer-lhe tudo que ele aceitava!

Muito sinceramente dúvido que o reitor da faculdade soubesse o que se fazia nas praxes!! E se acontecesse algum problema? Quem assumiria as consequências? Aposto que os veteranos seria os primeiros a desaparecer!!! Se calhar com amnésias seletivas ou alguma doença psicológica parecida...

Eu não me revi em nada daquilo, para mim as praxes não integram, não me ajudaram em nada... não procurei nada daquilo e estava lá metido...

No dia seguinte disse que não queria participar mais nas praxes e fui logo avisado que nem uma cadeira iria fazer naquela faculdade..

Lembro sempre um colega, o João Madeirense, que tinha cabelos compridos...Os veteranos queriam cortar-lhe o cabelo e um dia levaram uma tesoura para a praxe... O joão disse-lhes "o primeiro que me tocar no cabelo vai levar um soco"...

Bem dito, bem feito!!!

Ficámos os dois fora da praxe! 

Nos primeiros tempos todos os colegas olhavam para nós de lado...

Para muitos, este facto per si seria suficiente para mudarem de faculdade, sentirem-se postos de lado, faltarem às aulas, mudarem de curso... Ou seja o caloiro é quase obrigado a ser praxado senão é "odiado"... Acho ridículo!!!

As aulas começaram e toda agente andava em praxe...loucura total...NUNCA ACHEI PIADA...o que a praxe tinha a ver com o ensino superior? O que tinha a ver com o curso? 

Sempre me orgulhei de nunca ter sido praxado e também de nunca ter praxado...se ao menos pudesse praxar quem me tentou praxar!!!Isso é que era!!!

Não me revejo em nenhum destes rituais que têm vindo a terreiro: fins de semana para combinar praxes; comissões de praxe; termos de responsabilidade; rituais estranhos com colheres; ter de passar por experiências de humilhação...

Adoro a academia, adoro o conhecimento mas a praxe acho que não faz qualquer sentido, pelo menos nos moldes em que esta ocorre...

Concordo que algo deva ser feito a um  nível superior... A praxe deve ser opcional e quem não quiser fazer parte não deve ser julgado por isso... O que achas?


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